Olá, Bem Vindo ao Cenas, Cenários & Senões

Publico aqui textos de observação do cotidiano na forma de crônicas e contos.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Professor de Matemática - Publicado na Antologia da Livraria Asabeça 2006

Professor de Matemática

Conhecê-lo a qualquer tempo seria marcante, na adolescência foi incrível. Caminhava esquecido da pressa; uma perna mais arrastada que a outra, sempre em calças de brim escuro e camisas de manga curta xadrez.

Carregava uma pasta pesada que o fazia tombar mais para um dos lados, cabelos brancos anunciavam a aposentadoria há muito conquistada, o rosto marcado por uma varíola da juventude parecia sempre calcular algo em pensamento. O cenho franzido e o ar preocupado que só relaxavam ao dar solicitadas explicações. Na bagagem, equações, números, fórmulas; misteriosos triângulos com sábias soluções para tudo e todos.

O nome como uma acusação aos relapsos era Pacca com dois cês. Ignorava quem o chamava o sem o título professor ou mestre e respondia escrachado: “-Pacca não, que eu não tenho a tua idade!”

E não tinha mesmo! Podia ele ser o nosso avô, mas na determinação de permanecer ativo após a aposentadoria continuava ali, lecionando no colégio que ficava a apenas duas quadras da sua casa.

Vinha religiosamente todas as manhãs para da sétima série ao fim do colegial fazer-nos entender álgebra e trigonometria – missão quase impossível! Só ao chegar ao vestibular é que reconhecíamos como bem sucedida e aí, invariavelmente, era ele o paraninfo da formatura, homenageado pela turma rebelde que quase se arrependia das tantas que tinha aprontado e das maldições levantadas contra a disciplina e seu mentor.

Eu preferia que ele nem soubesse da minha existência, mas não foi o caso. Vítima dos números e dos desafios das contas, minhas notas foram desastrosas. Desconsolada com o resultado e descrente da possibilidade de domar o dragão matemático, desatei a chorar. Coisas de menina! Ele mesmo fez questão de acompanhar o assunto e se dedicar a dar-me explicações adicionais além das solicitadas pela turma. Resultado, na próxima prova, nota recuperada e um bilhete do mestre que dizia: “- Menininha obstinada! Vai além de Paracambi!”

Já lá se vão vinte anos desta história, o mestre aposentado com certeza já não leciona mais espero esteja, obstinadamente entre nós.

Não faz muito tempo, passei na estrada por uma placa que indicava Paracambi e pensei com um sorriso: - Cheguei!

Um comentário:

Mauricio David Ferman disse...

Oi, Monica!
Eu também me lembro com estima o nosso ilustre professor Pacca, que fez o dragão matemático ficar mais manso e me deu o gosto dos números, tanto que hoje eu mexo em números o tempo todo no trabalho.
Um abraço,
Mauricio Ferman